quarta-feira, 28 de abril de 2010

“NASCER É SOMENTE COMEÇAR A MORRER”* (Parte I)

(a jovem Cláudia Pais de 11 anos - foto cedida por Cristina Pais, mãe)

Se habitássemos num mundo perfeito: os filhos não poderiam envelhecer antes dos pais. Infelizmente, cada vez mais enfraquecido, o nosso planeta está cheio de mazelas. A medicina trava uma luta contra o tempo, onde a cada hora germina um novo mal por combater… Imagine então o que é ser mãe de uma criança com uma doença invulgar? Ter de entender que o seu bebé vai pular as fases normais do crescimento, à velocidade da luz? É impossível! Inacreditável! No entanto, existe e dá pelo nome de Progeria.
Ainda pouco conhecida, esta doença rara é uma forma de envelhecimento precoce. Denominada na sua forma mais severa de Síndroma de Hutchinson-Gillford, afecta cerca de 1 em 8 milhões de recém-nascidos. A esperança média de vida é de 14 anos (raparigas) e 16 anos (rapazes). Pele enrugada, cataratas, artroses e artrites, são alguns dos indícios das jovens vidas roubadas…

Todos os dias, Cláudia, uma menina natural de Viseu, sobrevive e celebra a vitória contra o tempo. Em teoria, ela sabe o que é a infância e a adolescência. Na prática, o destino pregou-lhe uma partida. Só tem 11 anos, mas fisicamente parece uma linda velhinha de 80. O relógio da vida não lhe deu hipótese de escolha. Porém, é uma criança forte e não vai desistir de lutar tão facilmente. Falamos com a sua maior aliada neste combate quotidiano: Cristina Pais, a mãe.

Aos 15 anos, Cristina já tinha sido mãe do pequeno José, repetindo o feito 10 meses depois com a Cláudia. Ambos os processos de gravidez e parto tinham corrido sem percalços.

Contudo, logo cedo, sente que algo não está bem com a sua filha?
Aos 4 meses e meio de idade, observei perda de peso e queda de cabelo nela. Fiquei um pouco alarmada. Como era um bebé pequenino, pensei que pudesse ser algo normal, ou seja, nunca algo tão sério. Fui ao pediatra, nada detectou. No meu coração, sentia que algo estava errado. Sentia-me impotente, sabia que a Cláudia precisava de ajuda e sozinha não sabia como fazê-lo.

E o que falavam os médicos?
Estavam totalmente no escuro. Desconheciam o que podia ser. Como esses sintomas se acentuaram, voltei ao médico e recorri a mais do que um. Infelizmente, somente aos 2 anos, é realizado o diagnóstico da Progeria. Foram feitos exames atrás de exames com resultados bons ou inconclusivos.

(Cristina Pais, mãe da Cláudia - foto cedida pela própria)

Até que finalmente, surge a confirmação da Progeria?
Sim. Uma altura, a Cláudia já tinha quase 2 anos, lembraram-se de mandar os ditos exames para diversos pontos do país e para o estrangeiro. O diagnóstico chegou: Progeria. Os médicos tentaram explicar-me, mas eles próprios nem sabiam o que era, uma vez que a Cláudia era o primeiro caso a surgir em Portugal.

Como definiria essa doença?
Tudo o que aprendi foi ao pesquisar e ler na Internet e claro depois com a ida aos EUA. Trata-se de uma doença rara de envelhecimento precoce, sem cura e cuja causa ainda é desconhecida. Caracteriza-se geralmente por: baixa estatura e peso, pele seca e enrugada, calvície, olhos proeminentes, tamanho do crânio muito desenvolvido, problemas cardíacos e doenças degenerativas próprias da velhice.

Ou seja, a criança salta a fase do crescimento normal e até das doenças comuns?
Exactamente. Por isso, temos de ter cuidados redobrados com estas crianças porque são como marionetas de corda ou bonecas de porcelana, podendo quebrar de um momento para o outro. Por exemplo, as deslocações ósseas são frequentes. A Cláudia fez uma luxação entre o ombro direito e a coluna, e partiu. Ora, ela não tem gripes ou assim, mas tem quase todas as doenças de que sofrem os idosos: desgaste ósseo, artrose, artrite, osteoporose, carência de cálcio... Outro exemplo: a menstruação. Ela não teve, isto é, passou por ela como o vento. A uma velocidade temporal inimaginável, veio e foi embora. Esta doença consome o corpo muito rapidamente, às vezes em segundos. Hoje, a minha filha pode estar óptima e amanhã piorar.

Não perca mesmo! Na próxima 4ª, saiba tudo sobre o tratamento da Cláudia nos EUA e em Portugal.


* Citação de Théophile Gautier (séc. XIX), escritor, poeta, jornalista e crítico literário francês.

quarta-feira, 21 de abril de 2010

TRABALHAR, ESTUDAR, LUTAR, MAS NUNCA DESISTIR (parte 3)

(Cortecega - foto cedida por Eugénia Santa Cruz)

E vai parar por aqui?
Não, não. Quero concluir a faculdade para tirar a licenciatura no Curso de Assistente Social. Mas optei por esperar uns 4 anos até as minhas filhas acabarem de tirar os seus cursos. Elas estão em primeiro lugar.
Outro dos meus objectivos é ser voluntária para poder ajudar o próximo. Embora com algumas paragens, já estive na paróquia Algueirão/Mem-Martins como catequista. Nem que seja através de uma visita, de uma pequena conversa, um beijinho a dizer estou aqui, são actos de extrema importância no apoio ao próximo. O sonho de fazer uma missão está presente. Quando as minhas filhas tiveram total autonomia, irei concretizá-lo.

Contudo, já concretizou o maior sonho da sua vida: Ser mãe. E correu riscos para tal?
Na nossa vida, passamos alguma vez por momentos dramáticos que nos marcam e eu não sou excepção. Sempre adorei crianças e queria muito ser mãe. Quando fiquei grávida, foi uma alegria. No terceiro trimestre, as coisas complicaram-se e perdi o bebé. Fui para a maternidade e tive de fazer uma ecografia para ver se o feto tinha saído todo. Eu levava a esperança que tudo não passasse de uma ameaça ou um pesadelo. Quando olhei para o monitor, queria ver o feto. A médica declarou calmamente «Filha, tens de tentar outra vez». Senti-me a pior mulher do mundo por não conseguir salvar o meu bebe. A seguir, tive mais dois abortos. Não desisti e finalmente: gravidez de alto risco! Devido ao insucesso das outras tentativas, o medo estava lá. Sempre que fazia uma ecografia, tinha vontade de ver e receio de ouvir. Tive 8 meses de cama a levar injecções diariamente, mas valeu a pena. Felizmente, a Ana Filipa nasceu saudável e hoje com 20 anos, está no 2º ano de enfermagem. Tenho o privilégio de ter outra linda menina: a Rita Isabel com 17 anos, que está no 11º ano. Ambas são voluntárias na Cooperação de Bombeiros Voluntários de Sintra. Estas princesas são a minha vida!

(Eugénia Santa Cruz - Foto cedida pela própria)

Além do espírito solidário, o que considera importante de transmitir a um filho?
(Embevecida) A amizade e a dádiva são outros valores transmitidos às minhas filhas. Os bens materiais e o estatuto não são os mais importantes. Procurem sempre a felicidade. Em 23 anos de casamento, nem tudo é um mar de rosas, mas a vida pode ser um jardim maravilhoso, se lutarmos por isso no dia-a-dia regando-o diariamente para as plantas crescerem.

É uma mulher lutadora e de fé?
(Olha para o Céu) Sem dúvida. É esta Fé que me guia. Já passei por várias cirurgias, estive nos cuidados intensivos 18 dias, 3 dos quais em semi-coma derivado a uma embolia pulmonar pós-operatória. Mas sou uma pessoa de bem com a vida e agradeço a Deus todos os dias por poder continuar a ver crescer as minhas filhas.
Sobre ter Fé e Esperança, tenho uma história triste mas que hoje me faz rir. Por volta dos meus 15 anos, andava no duro trabalho de picareta na mão a fazer valetas. As minhas mãos estavam a ficar cheias de calos e bolhas. A dor era tanta que até me vinham as lágrimas aos olhos. Então ajoelhei-me na berma da estrada, sozinha olhei para o céu, pedi a Deus que um dia elas me doessem de escrever à máquina. Anos mais tarde fui operada a uma tendinite na mão, uma das causas era de escrever no computador. Esta história além de triste, é engraçada e curiosa. Deixa-me a pensar.

E se essas mãos pudessem falar, diriam: “Graças a nós, esta menina já ganhou prémios!”
(Gargalhada e sorriso ternurento) Pois é. Elas são as minhas aliadas quando deixo fluir a minha paixão pela poesia. Despe pequena, gosto de escrever versos, histórias e contos. Tenho dois pequenos contos de Natal, ambos baseados na experiência beirã e ambos premiados pela Câmara de Sintra, um em 1º lugar, outro em segundo. Escrevo sobre tudo e nada, se estiver inspirada qualquer coisa ou facto serve. A minha própria vida é uma simples história de uma mulher beirã.

quarta-feira, 14 de abril de 2010

TRABALHAR, ESTUDAR, LUTAR, MAS NUNCA DESISTIR (parte 2)

(Casa-Convívio e Hospedaria de Cortecega, foto cedida por Eugénia Santa Cruz)
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E veio o suspiro de alívio…
(Ar aliviado) Finalmente, 8 meses depois, contemplamos a nossa morada: 3 quartos, uma sala, cozinha e casa de banho... Foi uma alegria enorme ver o sorriso da minha mãe ao ver que os filhos tinham um quarto e uma casa de banho. Fomos acabando as obras conforme podíamos. Tudo isto foi possível graças à cooperação das pessoas que com a sua boa vontade realizaram o sonho de uma família e de tantas outras.

Parece-me que as pessoas de Cortecega são solidárias e amigas?
(Animada) É verdade. A Beira Interior em si é assim. Mas em Cortecega, o que mais destaco é a bondade das suas gentes, as paisagens, a calma, o cantar dos passarinhos… Ao longo do ano vou várias vezes a minha aldeia, uma vez que não posso viver sem aquele verde, e também porque a Associação Desportiva e Cultural de Cortecega que, também ajudei de alguma forma construir, planeia diversas actividades. Acredito que a minha terra é um exemplo para tantas outras: o seu povo sempre muito divertido e unido, tudo tem feito para que Cortecega tenha as condições necessárias para receber os seus filhos, amigos e visitantes.

(Durante  a concentração de Agosto, fila dos Motards para o almoço; nesse dia, foram servidas 300 refeições; foto cedida por Eugénia Santa Cruz)
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Como por exemplo?
(Mais animada ainda) O Rancho Folclórico da minha aldeia é um exemplo giro. Percorri uma parte do país no rancho, onde andei dos 7 aos 15 anos. Depois passei para o Grupo de Danças e Cantares do Cadafaz. Ih, mas o melhor são dois grandes convívios: a concentração dos Motards em Agosto e o Almoço da Amizade na Páscoa. Há sempre uma forma de juntar toda a aldeia e os que residem em Lisboa para planear actividades e tudo o que isso implica a nível financeiro, logístico, etc. A Celeste (presidente da Associação) liga-nos e a palavra vai passando. Na véspera conforme vamos chegando de Lisboa e outros sítios, juntamo-nos aos da terra e toca a descascar batatas, limpar, arrumar… No dia D, homens, mulheres e filhos, todos estão a postos às 7 horas na Associação. Quem se atrasar, paga o pequeno-almoço! Depois, cada um sabe o que tem de fazer. É tudo caseiro: a Ilda dá batatas, Irene couves, Helena feijão, Beatriz sobremesas... Todos dão o que tem de cultivo, depois compra-se carne, peixe, enfim o que falta. Todos voluntários, tudo por amor à terra! Percebe agora porque amo tanto a minha terra!

(Almoço da Amizade - foto cedida por Eugénia Santa Cruz)
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Mas também foi por amor que deixou a sua terra?
(Ar enamorado) Embora já tivesse tido alguns namoricos de aldeia, comecei a namorar aos 15 anos com um jovem do mesmo concelho. Aos 23 anos, casei num belo dia de Outubro de 1986. Mudei-me para Lisboa porque o meu marido é agente da PSP e trabalhava na capital. Compramos casa na zona de Sintra, onde ainda hoje vivemos. É uma zona linda, é um privilégio viver aqui. As saudades da minha terra é que ai Jesus! O silêncio e a liberdade do campo, as pessoas que diziam «Bom dia, tia Maria! Bom dia nos dê Deus, prima!». Mas, já a minha mãe dizia que a mulher e o marido devem estar juntos. Arranjei emprego na embaixada de África do Sul, onde adorei estar. Depois fui chamada para a Câmara de Sintra, na qual entrei em Janeiro de 1989 e onde me encontro até hoje.

E foi a partir desse emprego que realizou um sonho adormecido?
(Sorriso de dever cumprido) Aos 19 anos, consegui um posto na área administrativa da autarquia de Góis. Tinha alcançado esse lugar por mérito próprio, por ser uma boa profissional, dedicada e sempre disposta a aprender mais. Nessa época, já acalentava em mim o objectivo de continuar a estudar. Quando entrei para a Câmara de Sintra, tive conhecimento de uma turma onde se poderia tirar o 5º e 6º ano. Quis logo inscrever-me, mas tive receio uma vez que já era Janeiro e as aulas tinham começado em Outubro. Surgiu a esperança quando me responderam que se conseguisse acompanhar a matéria e tivesse positiva nos testes, seria admitida. Agarrei-me ao estudo com as cópias cedidas pelos colegas e conclui o 6º. No ano seguinte, frequentei algumas unidades do ensino nocturno. No entanto, fiquei grávida e adiei os estudos. Cinco anos depois, conclui o 9º ano no programa Novas Oportunidades. Esperei também que a minha filha mais velha crescesse e pudesse tomar conta da irmã. Assim quando ela tinha 13 anos e o pai já não trabalhava à noite, voltei a escola. No fundo de mim, sentia uma grande paixão pelas formações que envolvem idosos ou crianças. Daí, escolhi o curso tecnológico de Acção Social. Três anos e o diploma nas mãos! Senti-me tão orgulhosa! Profissionalmente, sou uma pessoa realizada, pois trabalho na Divisão de Habitação e Acção Social.

Na próxima 4ª, veja como Eugénia nunca desiste e luta sempre pelos seus sonhos.

quarta-feira, 7 de abril de 2010

TRABALHAR, ESTUDAR, LUTAR, MAS NUNCA DESISTIR (parte 1)

(Eugénia Santa Cruz - foto cedida pela própria)

O cheiro a mimosa anuncia a Primavera. Os passarinhos cantam. Se não fosse o barulho urbano, poderíamos fechar os olhos, imaginarmo-nos no meio da Serra do Açor e vislumbrar lá do cima a pacata e animada povoação da nossa entrevistada. Quanto olhamos para ela, pensamos: «esta beirã não tem 46 anos. Tem tanta jovialidade! No mínimo, terá 26». Natural de Góis (Distrito de Coimbra), sugerimos a brincar que são os ares beirões, o elixir da eterna juventude. Eugénia Santa Cruz ri-se e entusiasmada fala com paixão da sua aldeia Cortecega.

Como era ser criança em Cortecega?
(Brilho nos olhos) A minha infância foi passada em Cortecega, onde nasci a 9 de Junho de 1963. Fui feliz, recebia dos meus pais muito amor. Aos 6 anos de idade, fui para a escola. Para tal, tinha de percorrer 8 Km todos os dias, uma vez que a minha aldeia ficava a 4 Km da vila onde era a escola primária. Levantava-me muito cedo para ir para a escola e quando regressava, ajudava a minha mãe no campo, guardava o gado, fazia a comida ou limpava a casa. A minha família era pobre, vivia do que a terra dava e daquilo que se ganhava no dia-a-dia, mas nunca passei fome como muita gente passou. Na nossa mesa havia sempre comida, mas lembro-me de a minha mãe estar a espera que todos acabassem de comer para ela comer os restinhos.
Por isso, não foi fácil e comecei a trabalhar muito cedo. Aos 10 anos, quando sai da escola, fui trabalhar para o campo e ao mesmo tempo, aprendia costura, bordados e renda numa costureira que ensinava raparigas. Guardo as melhores recordações desta senhora, a menina Belita, que graças a Deus ainda está junto de nós.
Mas essa escolha de vida não foi sua, pois não?
(Olhar perdido no tempo…) Não. Nesse tempo, era mesmo assim. Nessa época, as raparigas não iam para o ciclo preparatório. Eu chorei muito porque queria estudar. A minha professora da primária até mandou uma carta aos meus pais a dizer que era uma pena não continuar a estudar. Era boa aluna e muito empenhada.

(Cortecega - foto cedida por Eugénia Santa Cruz)

Entretanto, surge uma triste notícia…
(Emociona-se) Sim. O meu pai falece. A minha mãe continuou sozinha o seu papel de mãe e pai, criando 4 filhos: um de 16 anos, eu de 13, outro de 9 e o mais novo de 7 anos. A vida já não era fácil, a partir daí, foi uma luta maior. Comecei a “andar aos dias” para fora, ou seja trabalhar para outrém, em campos, obras, entre outros… Mesmo em tempos adversos, eu era feliz. O meu irmão e eu trabalhávamos muito para o sustento da casa e para ajudar na criação dos dois irmãos mais novos. A minha mãe era muito doente, infelizmente.

A meio da adolescência, dá-se uma espécie de reviravolta…
Por volta dos 14 anos, fui trabalhar para a floresta: plantava pinheiros, limpava as matas e no verão ia juntamente com outras pessoas apagar fogos. Aos 16 anos entrei para a Câmara Municipal de Góis para trabalhar na carpintaria da autarquia: envernizava madeira e tudo o que se relacionava com a mesma. Contudo, fazia mais coisas. Era a mulher de vários ofícios: limpezas e alcatroamento de estradas, criação de valetas com picareta… No final da tarde, lavava a cara com gasóleo para sair o alcatrão, pois ainda ia para a escola tirar um curso de costura que durou 6 meses. Entretanto, como éramos só duas raparigas, o Município transferiu-nos para outra função: responsáveis da limpeza das escolas primárias do concelho. Apesar de tudo, sempre era mais fácil do que as outras tarefas.

Nesse momento, germina uma ideia na sua mente…
(Entusiasmada) Arranjar a casa onde vivíamos! Quando o meu pai faleceu, ficou tudo parado. Na altura, tínhamos algum material, só que teve de ser usado por outras pessoas uma vez que ficamos sem nada. Então, reagi. Não podíamos baixar os braços. A casa era muito velhinha, tinha três divisões em madeira, dois quartos pegados e uma cozinha. As condições de habitabilidade eram más. Estava na hora de começar aquilo que o meu pai não tinha podido acabar.

(A minha casa na terra - foto cedido pela própria)

Aí, arregaçou as mangas e mãos à obra!
(Orgulhosa) Fui falar com o actual presidente da Câmara e pedi ajuda. Contei-lhe a nossa história e como vivíamos. O resultado foi positivo: respondeu que ia fazer tudo o que pudesse. Cheguei a casa, reuni os meus irmãos e mãe para dar a boa nova! A minha mãe começou a chorar com medo de não conseguirmos. Tranquilizei: «Mãe, vais ver que ainda vamos ter um quarto para os manos e outro para nós e uma casa de banho decente!». A casa velha foi deitada abaixo e fomos morar para a garagem de um tio. À noite, os meus irmãos iam dormir para o sótão de outro familiar. As obras iniciaram e todas as pessoas da aldeia ajudaram. A Câmara cedeu transportes para acartar o material e funcionários ao sábado para a cofragem das placas. Simultaneamente, soube de uma instituição americana que dava apoio material. Assim pedi auxílio e foi-nos oferecido azulejos, mosaicos para o chão e louças para a casa de banho.

Foi uma fase angustiante, não?
(Séria) Quando o meu pai morreu a minha irmã já estava casada e vivia em Lisboa, no entanto, dávamo-nos (e damo-nos) todos muito bem. Daí, o meu irmão mais velho e eu trabalhávamos para pagar as letras metidas ao banco para as despesas de pedreiros. O do meio dedicava o seu salário a alimentação da família e o mais novo estava na obra da casa. A minha mãe fazia o que podia. O meu marido, na altura namorado, fez toda a instalação eléctrica. A minha irmã deu as portas interiores da casa e todos os anos em Agosto lá nos encontrava. Por isso, durante o ano, estamos várias vezes juntos. Confesso que com 16 anos foi um fardo pesado para mim. Não queria preocupar a minha doce mãe. Passei algumas noites sem dormir a pensar como pagar os gastos de material, mão-de-obra, gerir o dinheiro porque tinha de ser bem dividido. Graças a Deus, nada ficamos a dever a ninguém, a não ser a nossa gratidão pela ajuda, mas isso não se paga!

Na próxima 4ª, saiba mais sobre essa beirã e a sua aldeia, ambas exemplos a seguir.