quarta-feira, 28 de outubro de 2009

PARTINDO DO ZERO (Parte 2)

Líbia (Imagem retirada da Internet)

Após alguns contactos, Horácio Sousa embarca para a Líbia com um contrato de 6 meses, como servente. Isabel enfrenta de novo as queixas da mãe por ter deixado ir o marido para fora do País. Alheia às querelas, a jovem de 20 anos fica em Portugal a tomar conta da casa e do filho de um ano. O marido passa 6 anos na Líbia, vindo ao seu país de 6 em 6 meses, durante apenas 15 dias. Lá, é promovido para manobrador de máquinas e ganha trinta contos por mês. O casal junta assim um pequeno pé-de-meia, compra um terreno e constroem uma casa. “É a casa que temos actualmente em Penela. No início, fomos viver para lá só com as paredes e a placa. Ele ia trabalhar e eu juntava o dinheiro. Quando ele vinha, íamos comprar material para a construção da casa”, conta com o sentimento de sonho realizado. Entretanto, adquire um pequeno terreno para cultivo da própria horta e o cônjuge volta uma temporada para Portugal. Nessa altura, ambos tiram a carta de condução. O espírito activo de Horácio leva-o a viajar de novo para Cabo Verde como cooperante (um ano e meio) e para a Argélia (4 meses). “Eu ficava sempre e criava o meu menino. Aí, graças a Deus, a minha casa já estava recheada de coisas da minha quinta”, exclama. Quando o marido regressa, pensava ela de vez, decidem arranjar uma carrinha para a venda ambulante de fruta. No entanto, a ideia empreendedora não resulta.



Suiça francesa
(Foto retirada da Internet)



Nessa altura, um sobrinho, emigrante na Suiça passava férias em Portugal. Horácio antevê uma oportunidade e pede ao familiar que o leve. Estávamos em 1988. Não querendo aguentar mais essas longas ausências, Isabel ruma também para a Suiça. “Fui ter com ele sem saber falar francês e sem conhecer a realidade daquele país. Já estávamos saturados de estarmos distantes um do outro e precisávamos de estarmos juntos. O mais difícil foi deixar o meu filho, já com 12 anos, com a minha mãe. Não o pude levar por dois motivos: não queria que ele saísse assim a meio do ano escolar e as leis da Suiça eram rígidas – ele não podia entrar na escola sem papéis e o meu marido só tinha contrato de 9 meses renováveis”, explica. Isabel ficou com o coração apertado, apesar de saber que o filho aceitava bem a situação, pois gostava muito dos avós e distraia-se na escola com os amigos. Na Suiça, o marido vai juntando os contratos de trabalho de 9 meses, até perfazer um total de 36 meses e obter os tão desejados documentos de residência, trabalho e afins. Por seu turno, Isabel aprende francês lendo jornais, dicionários e vendo televisão. Ao mesmo tempo, trabalha ilegalmente na cozinha de uma casa de repouso. A situação dura 2 anos até ser acusada por anónimos. Felizmente, algum tempo depois, consegue um contrato como camareira, primeiro num hotel longe de casa, depois num mais perto. Graças à situação regularizada do marido, Isabel volta para o primeiro local de trabalho: o lar de idosos, nos afazeres da cozinha, da sala de jantar e dos quartos. Nesse período, tentam que o filho com 17 anos venha viver com eles. Porém, o adolescente não se adapta, pois tem saudades da namorada, dos amigos, dos avós e da terra natal. Os pais, mesmo inconformados, deixam-no regressar e ficam felizes ao vê-lo tirar o curso de contabilista e ingressar numa empresa. Mais tarde, envereda para a GNR onde permanece actualmente. Adulto, casa-se e tem uma menina. Na Suiça, o pai sofre um acidente de trabalho sério. Recuperado, Horácio pensa em voltar de vez para Portugal para estar junto do filho, da nora e da neta. “Adorava a Suiça, mas o meu marido convenceu-me a regressar ao nosso país para estarmos com a nossa linda netinha. E assim foi, mas com a condição de termos um apartamento na cidade.”, confidencia. O casal escolhe um apartamento em Viseu por ser perto de Penela, ter a privacidade citadina e comparar-se um pouco ao tipo de vida suíço. Na cidade de Viriato, nem tudo é fácil. O marido arranja prontamente emprego na construção civil. No entanto, fica desiludido com as condições salariais e o estilo de vida e emigra para França onde se encontra actualmente. Passados dois anos, Isabel emprega-se finalmente como camareira em hotéis da Visabeira. Terminado o contrato de um ano, fica desempregada. “A vida aqui é dura porque não sentimos qualquer retorno na qualidade de vida e de trabalho. Por isso, o meu marido emigrou e eu se tivesse uma oportunidade, ia também”. Todavia, preferiu ficar.


Penela da Beira
(Foto retirada da Internet)



Sempre que pode, conduz até a aldeia de Penela e até São João da Pesqueira para estar com o filho e a neta. “Gosto de estar na minha casa da aldeia. Sinto-me livre e sossegada, cultivo a minha horta e trato do meu jardim. Só não vivo lá permanentemente porque é muito fria no Inverno e deserta. Os idosos conversam sobre o passado e a melancolia instala-se. No Verão, é muito mais bonita e animada, com festas, pessoas e convívio”, profere com alegria. No final, a pergunta da praxe sobre se era uma mulher feliz? A penelense responde que não tem sonhos, nem ambições, apenas quer viver “tranquila e com saúde e ver o filho feliz e a neta crescer”. E acrescenta, “considero-me uma mulher feliz porque lutei sempre. Apesar de nos termos casado sem nada e trabalhado muito, conseguimos as coisas com que sonhávamos e temos uma vida boa dentro das nossas possibilidades”.


Primeira vela da colecção, comprada em Veneza.

Antes de concluirmos a história de mais uma grande mulher beirã, quer saber uma curiosidade sobre a Isabel? Ela tem uma enorme colecção de velas! Já lhe perdeu a conta. “Tudo começou numa viagem à Veneza. Vi confeccionar tantas velas lindas, comprei uma e fiquei fã. A partir daí, comecei a comprar de todas as cores e feitios”, remata, soltando uma gargalhada sonora e mostrando divertida o armário das ditas.

Armário das Velas

2 comentários:

Anónimo disse...

Uma história igual a muitas outras que se passaram ou passam neste País. Infelizmente cá não temos os apoios que existem noutros Países, o desemprego e ordenados muito baixos não chegam para levar uma vida com dignidade e por isso os nossos fogem para longe.Não quer dizer que a vida lá fora não seja muito difícil porque é, mas compensa o sacrifício.Parabéns pela sua história de luta para conseguir tudo o que desejou. Bjs

Helena Teixeira disse...

É verdade,Kotta!E eu que o diga porque os meus pais sao emigrantes há muitos mesmo muitos anos.

Jocas gordas
Lena